sexta-feira, 19 abril, 2024 17:25

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Entendendo o sistema de saúde americano

O sistema de saúde dos Estados Unidos pode ser descrito como híbrido, sendo que em 2014, 48% dos gastos com saúde dos EUA vieram de fundos privados – 28% de famílias e 20% de empresas privadas. O governo federal foi responsável por 28% dos gastos, enquanto os governos estaduais e locais foram responsáveis por 17%. A maioria dos cuidados de saúde, mesmo se financiada publicamente, é prestada em particular, por empresas com ou sem fins lucrativos.

Há algumas iniciativas dos governos que podem auxiliar as pessoas em partes ou integralmente. Tudo depende da renda de cada um. Vale salientar, que, como foi explicado na parte 1, um indivíduo não precisa necessariamente contratar um seguro de saúde oferecido pelo seu empregador. Ele pode fazer isso por fora, e, dependendo de sua renda, pode conseguir uma ajuda do governo. Vamos conferir algumas iniciativas existentes.

Patient Protection and Affordable Care Act – Obamacare

O Ato de Assistência Acessível, ou ACA, popularmente conhecido como Obamacare, é uma lei promulgada para garantir que todos os americanos tenham um seguro de saúde acessível. Isso é feito oferecendo descontos aos consumidores (conhecidos como créditos tributários) em planos de seguro de saúde patrocinados pelo governo e expandindo o programa de assistência Medicaid para incluir mais pessoas que não têm incluído em seus orçamentos o pagamento de serviços de saúde.

A ACA também mudou algumas das regras que as companhias de seguros devem seguir. Por exemplo, no passado, se você tivesse diabetes ou alguma outra condição médica pré-existente, o custo do seguro seria astronômico ou a empresa poderia se recusar oferecer a cobertura. Sim, antigamente muitas pessoas não conseguiam nem contratar um seguro. Isso é bastante retratado no documentário Sicko, produzido por Michael Moore, em 2007. Quem contrata o seu seguro com subsídio do governo, em geral, também consegue franquias mais baixas.

Além disso, vale ressaltar que, quem tem seguro através do empregador, não se encaixa no Obamacare, já que ele é destinado, principalmente para pessoas e pequenos grupos que pagam pelo seu próprio seguro. Também é bom lembrar que o Obamacare não é um serviço gratuito – ele subsidia empresas de seguro de saúde.

O ato também determina uma lista de 10 procedimentos de cuidados em saúde especialmente relacionados à prevenção que todos os planos de saúde são obrigados a cobrir sem contar o deductible ou copayments. Entra nessa lista, por exemplo, o check-up anual.  

Medicare & Medicaid – como funcionam?

Medicare e Medicaid são dois programas de assistência de saúde ofertados pelo governo estadual ou federal, criados em 1965, cada um destinado a um público diferente e com premissas diferentes.

O Medicare é considerado um direito da maioria dos americanos. Pense no Medicare como um seguro de saúde fornecido para idosos (acima de 65 anos) e pessoas com menos de 65 anos que se qualificam devido a certas deficiências.  Quem pagou impostos do Medicare sobre seus ganhos enquanto trabalhava é automaticamente elegível para o Medicare aos 65 anos. Um adendo: cidadãos e residentes permanentes podem obter o Medicare se trabalharem nos EUA por pelo menos 10 anos e tiverem mais de 65 anos. Esta regra foi feita em 1996, durante o governo Bill Clinton.

O Medicare cobre qualquer pessoa que se qualifique, independentemente de sua de renda, histórico médico ou estado de saúde. Hoje, o Medicare beneficia cerca 60 milhões de pessoas idosas e jovens com deficiência. O programa ajuda a pagar por muitos serviços de assistência médica, incluindo hospitalizações, consultas médicas, medicamentos prescritos, serviços preventivos, assistência médica domiciliar e assistência em cuidados paliativos. O Medicare é dividido em Parte A, B, C e D, cada um com particularidades que não serão aprofundadas aqui. 

Já o Medicaid é um programa de assistência pública pago com fundos públicos coletados por meio de imposto de renda.  O programa, que oferece seguro de saúde a americanos de baixa renda de todas as idades, funciona de maneira diferente em cada estado. Os padrões de renda para o Medicaid geralmente são baseados no nível federal de pobreza, mas cada estado determina esse teto.

Quem se qualifica para o Medicaid? 

Além da questão financeira, a pessoa precisa pertencer a um dos seguintes grupos:

• Gestantes – mulheres solteiras ou casadas, podem solicitar Medicaid se estiverem grávidas e atendam aos requisitos de renda. Mãe e filho serão cobertos.

• Pai de um menor ou adolescente que mora sozinho – quem tem um filho menor de 18 anos e tem necessidades financeiras. Se o filho estiver doente e precisar de cuidados especializados – mas puder ficar em casa com cuidados médicos de qualidade – o Medicaid poderá ajudar. Medicaid também cobre adolescentes que vivem por conta própria. Alguns estados permitem cobertura para dependentes até 21 anos.

• Idoso, cego ou com outra deficiência – pessoas com necessidades médicas podem se inscrever independentemente da idade.

• Indivíduos sem deficiência e sem filhos menores de 18 anos – indivíduos de baixa renda com menos de 65 anos sem deficiência ou sem filhos. 

“Quando me mudei para os Estados Unidos pela segunda vez, trabalhei como freelancer e não tinha um salário propriamente fixo, por isso quando fui procurar por um plano de saúde optei pelo do governo”, explica Clarice Sgaria, que é cidadã americana. “O Medicaid na época pediu pelo meu social security number, imposto de renda, endereço e com isso fui apta a não pagar pelo plano. Tinha direito a consultas médicas, entrada em hospital, desconto em remédios, tudo de graça”.  Depois de um ano, Clarice trocou de emprego, tinha um salário fixo e o cenário mudou. “Na hora de renovar meu plano de saúde, eu não estava mais apta à cobertura total do governo. Eles me deram a opção de escolher entre alguns planos e pagar um valor mensal por ele”, conta. Depois de algumas pesquisas, Clarice optou pelo plano Heath First, através do qual ela paga $20 por mês e ainda precisa efetuar o copay em qualquer entrada em hospital, ida ao médico, exames etc. O valor do copay do plano de Clarice pode variar de $15 a $150. “Eu sou o tipo de pessoa que vai ao médico uma vez ao ano para um check up e por isso por enquanto funciona. Infelizmente, com esse plano tenho acesso limitado a alguns médicos, tratamentos, hospitais, remédios etc.”. Clarice também teria a opção de contratar um plano através de seu empregador – com preços e cobertura diferentes.

E a história de que atendimento médico não é negado?

Você talvez também já ouviu falar que, na prática, ninguém fica sem atendimento médico nos Estados Unidos, certo? Promulgada em 1986, Emergency Medical Treatment and Active Labor Act, conhecida como EMTALA, é uma lei federal que determina que qualquer pessoa que precise de atendimento em uma situação emergencial seja tratada – independente do seu status ou orçamento. Essa lei se aplica a quase todos os hospitais dos Estados Unidos, com exceção de alguns hospitais particulares e militares. Há três obrigações criadas pela lei:

• Qualquer pessoa que chegue em uma emergência necessitando atendimento deve ser examinada para determinar se existe uma condição médica de emergência. A lei protege o paciente, assim, o hospital não pode atrasar o atendimento para perguntar sobre métodos de pagamento ou seguro.

• Se a condição de emergência for comprovada, o tratamento deve ser oferecido até que a condição seja resolvida/estabilizada.

• Os hospitais com mais estrutura e capacidade têm que aceitar transferências de hospitais que não têm a capacidade de tratar condições médicas de emergência instáveis.

Na teoria, qualquer pessoa poderia se sentir confortada ao saber que terá atendimento independentemente de qualquer circunstância de orçamento, seguro, status imigratório, gênero ou cor. Na prática, vale lembrar que tal lei não garante atendimento gratuito. O hospital pode cobrar do paciente e inclusive processá-lo por contas não pagas.