segunda-feira, 29 abril, 2024 22:19

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Por que o Dólar é uma moeda forte?

Viver Magazine Maio 2022 Dinheiro

“Uma moeda não nasce forte, ela se torna forte.”

Não há dúvidas de que o Dólar é a principal moeda usada no mundo hoje. Ela é tão preciosa que em tempos de crise acaba tendo um papel de destaque em economias não tão desenvolvidas como a Brasileira. Mas será que sempre foi assim?

Para entender o que tornou esse precioso pedaço de papel verde a moeda forte dos dias de hoje, precisamos voltar um pouco no passado. No período entre 1815 a 1914 a Economia Global era alicerçada por um modelo econômico usado desde a antiguidade e que foi oficializado, chamado de “Padrão Ouro”. Funcionava assim: o valor da moeda de cada país correspondia as reservas do metal precioso que cada um possuía. As moedas, em realidade, eram meramente um recibo dessa reserva de Ouro. Se um país quisesse ter mais dinheiro impresso, precisaria obter mais ouro. Para você ter uma ideia,  1 Dólar na época era equivalente a 1/20 de Onça (1,4 gramas). Você, em teoria, poderia ir ao banco mais próximo da sua casa e trocar seus dólares por ouro.

O fato de Ouro tecnicamente não perder nunca o seu valor fez com que esse período fosse de grande crescimento econômico, como também baixos índices de inflação. Nesses tempos, a moeda que dominava o mundo era a Libra Esterlina Inglesa, que era a grande potência mundial, dominando mais 25% de todo o território do globo terrestre. Conhecidos na época como Grande Império Britânico, o país foi o protagonista da Revolução Industrial.

E o dólar? Nessa época ele já existia, mas era uma moeda pouco confiável. Os Estados Unidos não eram vistos como um grande país, mas sim devedores pouco confiáveis e sem um sistema monetário unificado.

Em 1914 porém, estourou a Primeira Grande Guerra, que jogou por terra o conceito do “Padrão Ouro”, já que a maioria dos países envolvidos precisavam de recursos para financiar os altos custos de suas batalhas. Muitos começaram simplesmente a imprimir dinheiro, mesmo não havendo ouro suficiente para garantias.

A guerra acabou só em 1918, mas iniciou um período muito traumático para a Economia Mundial, marcado por uma série de acontecimentos:

• 1914-1918 – Primeira Guerra Mundial, já citada

• 1918-1925 – Recuperação econômica no Pós-guerra.

• 1929 – Crash da Bolsa de Nova York.

• 1939-1945 – Segunda Guerra Mundial.

Esses fatos geraram uma série de problemas econômicos como a impressão desenfreada de papel moeda sem o lastro do Ouro, grandes flutuações cambiais e altos índices de inflação. A Alemanha chegou a ter 21.000% de inflação mensal em 1921. Um dos poucos países favorecidos por esses acontecimentos foi os Estados Unidos, que passou a ser grande fornecedor de todo o tipo de mercadoria para a Europa e outros países envolvidos nos conflitos da Segunda Guerra. Os bancos americanos, com reservas abundantes, também negociaram muitos empréstimos em Dólar a esses países. Em poucos anos, eles se tornaram a Potência Econômica e Militar mais poderosa do Mundo.

Já prevendo o final da guerra (ainda em curso, mas próxima de acabar) e as pesadas consequências que ela traria para a Economia, os 44 principais países do mundo se reuniram em Julho de 1944 na cidade de Bretton Woods, nos Estados Unidos, numa conferência monetária e financeira que levou o nome dessa bucólica cidade. 

O objetivo da reunião era o de literalmente reconstruir o capitalismo mundial e estabelecer as novas regras do “jogo”, para a retomada do crescimento. A principal regra definida em Bretton Woods foi a obrigação de cada país em adotar uma política monetária onde a taxa de câmbio de suas moedas tivesse o valor indexado ao Dólar. Por sua vez, o Dólar teria como seu lastro o Ouro, garantido pelo Federal Reserve (banco central americano), onde 35 Dólares valeriam sempre 1 Onça de Ouro (28 Gramas) aconteça o que acontecer.

Outras ações que surgiram nessa conferência foram a criação de vários órgãos mundiais para auxílio econômico como o FMI (Fundo Monetário Internacional), BIRD (Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento, que virou o Banco Mundial mais adiante) e a OIC (Organização Mundial do Comércio). Essas instituições serviriam para ajudar aos países que enfrentavam dificuldades a planejar melhor sua reestruturação através de empréstimos. Tudo isso vinha com o “presente” de serem obrigados a usar o Dólar como moeda de lastro da sua economia e seguir regras rígidas de controle econômico.

O Acordo de Bretton Woods começou a valer efetivamente em 1949, quando houve o consenso dos principais países envolvidos. No fim dos anos de 1960 a Economia Global já havia se recuperado bastante. Com isso, alguns países como Canadá, Inglaterra e Japão começaram a boicotar o sistema de Bretton Woods através de vários artifícios comerciais, entre eles a compra de ouro em larga escala. Tudo para diminuir a dependência dos americanos.

Esse boicote forçou os Estados Unidos a acabar com o acordo de forma unilateral em 15 de Agosto de 1971, através de um decreto do então presidente Richard Nixon e por isso acabou sendo apelidado de “Nixon Shock”. A partir desta data, o Dólar acabou se tornando “Moeda de reserva garantida por si só”, não estando atrelado a mais nada e sendo controlado apenas por direcionamentos políticos e burocráticos. 

Mas qual é a vantagem nisso? Dessa forma, os Estados Unidos conseguiram liberdade  para imprimir a quantidade de dólares que desejasse, sem se preocupar com reservas de ouro. A única garantia é a certeza de que este país continuará a ser uma grande potência econômica e militar, além de ser um mercado para se fazer bons investimentos. Outra garantia é que os Estados Unidos possuem o monopólio de negociação dos principais commodities do mundo, como o petróleo. Todos são negociados em dólares.

Essa decisão gerou efeitos colaterais. Aconteceram uma série de crises globais, sendo as mais graves as crises do petróleo de 1974 e 1979. Além disso, o Dólar entrou numa escalada progressiva da inflação e desvalorização que dura até hoje e leva consigo uma dezena de outras moedas. 

Para você ter uma ideia, um Ford Mustang básico custava em 1971 aproximadamente US$ 2.973. Um Ford Mustang básico, modelo 2020, custa hoje $26,670 (quase 10 vezes o valor de 1971).

Essa política estabelecida em 1971 segue até os dias de hoje. Existiram algumas ameaças a essa hegemonia, como a criação do Euro em 1998 e mais recentemente da China, que tem feito grandes compras sistêmicas de ouro no mercado mundial. Até o momento, nada conseguiu abalar a solidez das verdinhas do dólar, que segue firme e forte influenciando desde o pãozinho que vamos comer até o valor dos juros da dívida brasileira.