“Definimos o amor não como ele nos acontece, mas como gostaríamos que ele fosse. Assim, o amor se torna um sentimento meio divino, uma
meta de vida, que poucas pessoas conseguem alcançar”.
O amor está entre os sentimentos que inspiraram as melhores histórias da humanidade. As histórias de amor tocam diretamente o nosso coração. Provavelmente, todas as pessoas querem viver uma história de amor, e as que não querem provavelmente não o querem por medo. Mas não é isso o que importa aqui. No fundo, todas as grandes histórias humanas são histórias de amor. Neste artigo, quero falar especificamente sobre o amor nos relacionamentos românticos. O que pode o amor? Aliás, antes de tudo, o que é o amor? E mais: o amor é um sentimento suficientemente forte para sustentar um relacionamento?
Essas são as perguntas que buscarei responder aqui.
Acredito que a maioria das pessoas definiriam o amor como querer o bem do outro. Entretanto, não é isso que é o amor, e acredito que se você olhar com atenção irá concordar comigo. Quando amamos, estamos falando, fundamentalmente, de desejo e prazer intensos. Se você
ama seu namorado, você está falando sobre o seu desejo por ele, seja sexualmente ou o desejo de construir uma vida juntos. Se você ama um amigo ou um filho, você está falando sobre o prazer que sente com o bem-estar dele. Se você ama ouvir música ou viajar, você está falando sobre o prazer que sente ao fazer essas coisas, ou sobre o desejo de fazê-las. Enfim, falar de amor é falar sobre sentir desejo e prazer intensos. E quando sentimos desejo ou prazer não intensos, dizemos que só gostamos de uma coisa ou pessoa.
Não é assim que nomeamos nossos sentimentos?
Acontece que geralmente quando sentimos desejo por uma coisa ou pessoa, ou prazer por uma coisa ou pessoa, queremos o seu bem. Contudo, querer o bem não é uma característica que define o amar, mesmo que esteja presente em muitas de suas realizações. Além disso, queremos o bem que achamos ser o melhor para essa coisa ou pessoa. E o bem que achamos ser o melhor nem sempre é o melhor, às vezes pode, inclusive, ser o pior. Mesmo no amor é um desafio olhar a vida do outro com os olhos do outro. Por exemplo: uma esposa insegura que ama seu marido pode proibi-lo de ter uma vida social saudável, ou um marido inseguro pode fazer o mesmo. E isso nada tem a ver com
falta ou excesso de amor. O ciúme, aliás, nada tem a ver com falta ou excesso de amor, mas voltarei a esse ponto. Aqui, o importante é que o amor existe se há desejo ou prazer intensos, mesmo que na ausência de um querer o bem que realmente seja o bem para a coisa ou pessoa amada.
Pessoas que amam podem mentir por medo de ofender ou perder a pessoa amada, podem ofender por raiva, trair, podem inclusive matar por não suportarem a vida sem aquela pessoa. Novamente, amar não necessariamente tem a ver com querer o bem do outro, porém sempre tem a ver com desejo ou prazer intensos. Essa é a organização conceitual do amor, sua definição. Ocorre ainda que normalmente a pessoa que ama quer o bem do parceiro somente enquanto ele faz o seu bem. Assim, após o término, mesmo que o amor ainda persista, ou exatamente por causa da persistência do amor, o companheiro rejeitado pode querer especialmente o mal da pessoa amada. Relações assim são Tristemente comuns.
Prefiro definir assim o amor porque é assim que ele nos acontece na vida cotidiana. Podemos usar uma definição transcendente, fazer uma definição ideal do amor, como se ele fosse um sentimento que estivesse fora de nós. Dessa forma, definimos o amor não como ele nos acontece, mas como gostaríamos que ele fosse. Assim, o amor se torna um sentimento meio divino, uma meta de vida, que poucas pessoas conseguem alcançar. Eu rejeito definições transcendentes sobre o que acontece em nossas vidas, prefiro explicações imanentes, ou seja, que utilizam elementos presentes nas coisas que queremos explicar. Em outras palavras, uma definição transcendente seria afirmar, por exemplo, que um homem ou mulher apaixonada que mente para o companheiro não ama, porque, nessa visão transcendente, quem ama não mente ou não falta com o respeito. Mas não é assim que o amor nos acontece, não é?
Assim definido o amor, espero que esteja claro que o querer o bem do outro é uma consequência desejável do amar, não uma característica intrínseca a ele. Essa definição nos abre caminho para entender o papel do amor nos relacionamentos românticos. O amor sozinho é capaz de sustentar um relacionamento? Não, não é. E não é capaz justamente porque a construção de uma vida juntos depende de muitos outros elementos que não o desejo ou prazer intensos.
O respeito, por exemplo, é uma atitude que pode aparecer na pessoa que ama, porém, como vimos, não é uma característica intrínseca ao amor. Assim, podese amar e não respeitar. E não há relacionamento que sobreviva sem respeito, a não ser na absoluta submissão de uma das partes. A possessão é outra atitude comum nos relacionamentos românticos. Ela ocorre quando um se comporta como se fosse proprietário do outro, assim faz exigências, ou pedidos com chantagem emocional, que levam o companheiro a se adequar aos interesses dele. O ciúme pode levar à possessão. E isso nada tem a ver com o amor, embora ocorra frequentemente durante o amar das pessoas. Ciúme e possessão tem a ver com medo, insegurança e as crenças das pessoas sobre o papel do homem e da mulher em um relacionamento, não com o
amor.
Embora amar não signifique necessariamente querer o bem do outro, acredito que sem o amor o querer o bem do outro exista apenas como atitude racional, sem o fundamento emocional indispensável para sua sustentação. Só queremos o bem do outro de verdade quando sentimos
prazer com seu bem-estar, e sentir prazer tem a ver com amar. Em outras palavras, mesmo não proporcionando uma garantia, só o amor nos faz capaz de querer o bem das coisas ou pessoas que nos são valiosas. Por isso, embora ele sozinho não sustente um relacionamento, sua existência é fundamental.